Universitários têm problemas de leitura (ou da falta dela!)
Os dados da notícia do jornal o Globo são do Rio , mas em São Paulo os valores se assemelham: 34% não lêem com freqüência, 18% não gostam de ler e 16% lêem apenas de vez em quando.
Um dos problemas disto é uma redução do vocabulário. Mas e daí ? Para que é necessário um bom vocabulário ?
Bem, notem que palavras se referem a objetos e idéias; cadeira e justiça, por exemplo. Dito de uma forma mais técnica; podemos afirmar que o mundo é linguisticamente constituído. Isto quer dizer que o mundo em que vivemos depende da linguagem que falamos.
Note que não estou dizendo que o mundo natural depende do que falamos. Nem de longe dizer que se chamamos boi de jacaré, ele se torna um. Nada disto; a assertiva é mais sutil. O mundo no qual EU vivo é um mundo social. Eu vivo entre pessoas. Dentro de certos limites, o mundo natural “apenas” dá o contexto da minha vida. Ao comunicar-me com o outro, eu uso as palavras para referir-me a objetos e idéias. Assim, ter mais palavras significa poder falar de mais objetos e idéias. A comunicação fica então mais rica e variada.
Mais que isto, em alguns casos, “saber” mais palavras é o que separa o leigo do especialista. O que é cristal piezoelétrico ? Histoplasmose ? Embargo ? Redução ao absurdo ? Subsunção obliterativa ? Lepton ?
Note que coloquei “saber” entre aspas. Isto para ressaltar que “saber” aquelas palavras não significa apenas ser capaz de enunciar as suas definições. Implica em entender o que significam e ser capaz de utilizá-las de forma inteligente, inserindo-as na teoria que as acolhe.
Há ainda outro benefício. Saber mais palavras nos ajuda a pensar. A razão é a que já dissemos: o mundo é linguisticamente constituído. Aqui, entender o mundo e inserir-se nele depende das palavras que possuímos. Para começar, um exemplo muito simplório. Sabemos todos que sofá e poltrona são dois objetos diferentes que têm uma função em comum: sentar. No entanto, se chamamos ambos de “sentador”, então para nós sofá e poltrona serão uma única e mesma coisa. Não adianta dizer que você estará vendo duas coisas diferentes e embora tenham o mesmo nome você saberá que são diferentes. Duvida ?
Então façamos um teste. Responda a pergunta abaixo antes de ler o restante do texto:
- O que é febre ?
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Respondeu ?
Então prossiga.
Muito provavelmente você respondeu que febre é quando a pessoa está com a temperatura elevada. Isto é, você “vê” uma pessoa com a temperatura corporal maior que o normal e então diz que ela está febril. E não está errado. Mas isto é o que você “vê” porque isto é o que é possível “ver” com a definição de febre que você possui.
Mas se você fosse um médico, você provavelmente “veria” outra coisa. Médicos sabem que “febre” é uma síndrome, isto é, um conjunto de sinais e sintomas (olha aí outras palavras – qual é a diferença entre sinal e sintoma ?). Assim, para este profissional a síndrome febril caracteriza-se principalmente pela presença de uma tríade: hipertermia (aumento da temperatura), hiperemia (vermelhidão da pele) e taquisfigmia (aumento da freqüência cardíaca percebida pela palpação do pulso).
Por isto, quando um médico diz que alguém está com febre, é porque ele “viu” uma pessoa quente, com o rosto afogueado e o pulso rápido. Já o leigo só terá visto a temperatura elevada. Qual é a diferença ? – As diferentes definições que cada um possuem da palavra “febre”.
Mas e daí ? Esta baboseira toda tem alguma importância prática ? Bem, cada um pode ter sua própria opinião. Mas se algum dia você sentir:
-
uma forte dor em pontada no lado esquerdo do peito,
-
dormência no braço esquerdo e
-
sensação de desfalecimento,
Sugiro fortemente que você não procure um arquiteto. OK ?