Neurociência e Aprendizagem: A Língua no Cérebro
Sobre o alemão Peter Indefrey, bastaria dizer que ele é um dos mais respeitados neurolingüistas da atualidade e autor de vários livros e artigos sobre os processos cerebrais envolvidos na aquisição de uma segunda língua.
Porém, a linha mais peculiar em seu vasto currículo – para o público brasileiro, pelo menos – é o fato de ele ter trabalhado como médico em uma pequena cidade do Espírito Santo e ter aprendido português para entender as músicas cantadas por Gal Costa. “As pessoas de lá foram muito simpáticas, e eu vivi alguns dos melhores momentos da minha vida naquela época”, revela. Sua única decepção foi descobrir que, por aqui, bandas estrangeiras faziam mais sucesso que sua então Intérprete favorita.
Doutor pela Universidade Helnrich Heine (Alemanha), Indefrey é pesquisador do Instituto Max Planck para a Psicolingüístlca e do Centro F. C. Donders para Neuroimagens da Cognição, ambos na Holanda.
A questão da proficiência é, no momento, um dos temas mais quentes da neurociência de aquisição da segunda língua. Um ponto de Interesse desse tópico pode ser resumido na seguinte pergunta:
É possível falar uma língua estrangeira com a mesma desenvoltura com que se fala a primeira?
Para esse neurolingüista alemão, sim. Mas a resposta está longe do consenso entre especialistas.
E ter ‘ouvido’ para a música facilita falar uma segunda língua?
Quantas línguas nosso cérebro é capaz de aprender?
Há uma idade-limite para se falar outra língua sem sotaque?
O que dizem estudos neurolingüisticos sobre a chamada hipótese do período crítico [ou seja, a de que haveria uma janela temporal para se aprender uma língua]? É verdade que todas as crianças têm o prazo de 12 anos para adquirir uma língua? O que acontece realmente no cérebro depois disso?
O período crítico, assim descrito, é um mito. Nada se ‘encerra’. Em vez disso, o que pesquisadores como meu colega David Birdsong [da Universidade do Texas, em Austin (Estados Unidos) e, desde 2002, professor visitante do Instituto Max Planck de Psicolingüística, em Nijmegen] observam é um declínio gradual na proporção de pessoas que aprendem uma segunda língua e passam a falá-Ia com a mesma proficiência que têm na língua materna.
Mas sempre se achará alguém que fala uma segunda língua perfeitamente, mesmo que tenha começado a aprendê-Ia tardiamente. Esse declínio gradual começa em idades diferentes para aspectos diferentes da língua.
Para falar sem sotaque, é mais importante começar cedo. Já para ganhar vocabulário, mais importante do que a idade de início é a quantidade de tempo dedicada à aprendizagem. Não há, portanto, nenhuma mudança súbita no cérebro por volta dos 12 anos de idade.
O que pode acontecer é que, no decurso da aquisição da primeira língua, algumas regiões do cérebro se otimizam para as propriedades dela. Mais tarde, quando se aprende uma segunda língua, usam-se as mesmas estruturas, mas elas, então, já não são tão eficazes para outras línguas. É por isso que essas estruturas cerebrais tendem a ser mais fortemente ativadas quando a pessoa tem mais dificuldade em aprender outra língua, pois elas devem se esforçar mais.
Confira a integra desta entrevista exclusiva em: Ciência Hoje, vol 41, no. 242, pg 10-13.