Falar e fazer justiça
“Isso não é justo!” virou uma expressão fora de moda. Os brados de hoje preferem gírias ou até mesmo os palavrões para expressar a sensação de indignação diante de algo injusto. Todo mundo já sabe que a indignação moral não é, por si só, ética. Ética exige ação e a ultrapassagem do mero incômodo para a busca de uma solução”…
Falar da boca para fora parece ser um gesto gratuito. Mas será que não faz realmente diferença o modo como dizemos as coisas?…
Palavras são naturalmente carregadas de significados e sempre são ditas em contextos que ajudam a entendê-Ias. Sejam as mais singelas, sejam as mais fortes, elas sinalizam algo. Se metade da verdade está no que queremos dizer, a outra metade está na forma como dizemos. É bom não esquecer na hora de falar”!…
Dizer é fazer. Entre o dizer e o fazer há uma ligação tão íntima que as pessoas que as dissociam perdem a confiança das demais…
Mesmo assim, aquele que fala uma coisa e faz outra já carrega em sua própria fala um ato, o da mentira. Quando fala, ele age como mentiroso…
Nesse sentido, toda linguagem já está cheia de ética ou da falta dela. Tudo que parece só linguagem já está cheio de ação. Tudo que dizemos é também o que fazemos, e, se fazemos diferente do que dizemos, caímos em contradição…
Tudo que fazemos com nossas meras palavras provoca efeitos nas pessoas com as quais convivemos…
Só podemos agir corretamente se pensamos no que fazemos. Pensar no que fazer é “justamente” achar a medida entre os excessos. Isso nos faz pensar na qualidade das coisas que dizemos. Pois o que dizemos define a qualidade do que provocamos ao nosso redor. A justiça, portanto, deve ser aquele elemento que nos ajuda quando estamos pensando em dizer algo ao outro, levando em conta as conseqüências do que será dito. Não é apenas o julgamento perante a lei e a ordem, mas o julgamento que leva em conta minha responsabilidade sobre o que sou capaz de dizer. Sem chance para quem tem mania de falar da boca para fora.
(Marcia Tiburi: Extrato do texto de mesmo nome publicado em Vida Simples, setembro de 2008)