Dos que vão, para os que ficam
Quanto à influência da morte de um ente querido sobre aqueles que ele deixa para trás, há muito me parece que não deve ser senão a de uma responsabilidade maior. Quem está partindo não transmite um cêntuplo de coisas iniciadas aos que sobrevivem a ele, para que as continuem — se eles partilhavam algum tipo de vínculo interior? Nos últimos anos, tive de aprender sobre tantas experiências íntimas de morte, mas não houve uma pessoa tirada de mim sem que eu não sentisse aumentarem as tarefas a meu redor. O peso dessa ocorrência não esclarecida e talvez a mais colossal de todas, que apenas por um mal—entendido ganhou a reputação de ser arbitrária e cruel, empurra-nos mais para o fundo da vida e exige os mais extremos deveres às nossas forças pouco a pouco crescentes.
Rainer Maria Rilke, Cartas do Poeta sobre a vida