O que é aprender a aprender? – Nossos princípios teóricos
Introdução
Na semana passada apresentamos a nossa fundamentação teórica. Tratamos genéricamente das “Pedagogias do Aprender a Aprender”. Ali explicitamos quatro princípios que norteiam esta pedagogias:
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Desenvolvimento da autonomia do aprendiz.
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Apropriação do método científico.
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Ênfase nos interesses e necessidades da própria criança.
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Visão de sociedade em constante mudança e valorização progressiva do trabalho intelectual.
Hoje, ainda do ponto de vista mais teórico, apresento aquilo que específicamente modula o nosso trabalho. A idéia aqui não é de dissertar sobre cada conceito, mas mostrar que reflexos tais conceitos tem sobre nossa prática. Enfim, como prometido na semana passada, discutiremos o aprenda a aprender sob a ótica das crenças epistemológicas, metacognição, estilos e estratégias de aprendizagem.
Estratégias de aprendizagem
Segundo Flavell (apud SILVA; SÁ, 1997 p.19) as estratégias de aprendizagem “podem ser definidas, a um nível mais complexo, como processos conscientes delineados pelos estudantes para atingirem objetivos de aprendizagem e, a um nível mais específico, como qualquer procedimento adotado para a realização de uma determinada tarefa”.
Para ele, as estratégias são complexas, pois auxiliam tanto no cumprimento de rotinas simples (sublinhar o que nos parece mais importante para depois recuperar as idéias principais quando voltarmos a ler apenas os sublinhados), quanto na elaboração de um planejamento para atingir um objetivo de aprendizagem.
Em termos gerais, a aplicação adequada das estratégias de aprendizagem implica no estabelecimento do objetivo que se pretende atingir, que pressupõe uma intencionalidade de ação por parte do sujeito, na avaliação das próprias competências intelectuais, e no tempo e esforço requeridos.
Assim sendo podemos entender as estratégias de aprendizagem como planos estabelecidos pelo aprendiz para atingir objetivos de aprendizagem. São portanto maneiras de fazer. Estes modos de fazer são portanto técnicas, que incluem pelo menos dois aspectos. O primeiro está ligado ao pensar e planejar – organizar-se em função de um objetivo. O segundo refere-se a um fazer mais concreto – sublinhar, ler, esquematizar, etc. Este segundo aspecto é o que se liga mais diretamente ao conceito de técnicas de estudo.
Este conceito, em nossa opinião subordina-se aos princípios acima listados. Enfatisamos a autonomia do aprendiz ao planejar seu estudo visando objetivos próprios e em respeito às suas características pessoais. Este planejamento se faz com base no método científico. Finalmente, tudo se dá em um contexto onde a “sociedade do conhecimento” está sempre presente.
Nossos alunos estão geralmente movidos por necessidades de aprendizagem relevantes para suas vidas. Por isto um aspecto importante e explícito de nossas atividades é o ensino destas técnicas de estudo. Trabalhamos para que nossos alunos:
- Possam ler com rapidez e compreensão,
- Sublinhem de forma inteligente,
- Esquematizem para compreender e memorizar.
- Resumam para obter o essencial.
- Façamr provas com eficiência e segurança.
- Estudem de forma autônoma e independente.
Estilos de aprendizagem
Keefe (1989) define estilo de aprendizagem como a maneira pela qual o aprendiz percebe, interage e responde ao ambiente de aprendizagem. Logo, o estilo de aprendizagem seria uma combinação das características cognitivas, afetivas, comportamentais e psicológicas. Estilo cognitivo de aprendizagem também pode ser definido como padrão diferenciado, individual, de reação diante da estimulação recebida, de processamento cognitivo da informação e de enfrentamento cognitivo da realidade (Fierro, 1990).
Para Pinto (2000), estilo de aprendizagem é a maneira pela qual os traços pessoais se expressam na arte, no comportamento, na forma de viver e aprender. Quando o estilo que se usa está bem adaptado às características individuais, o resultado é a melhor postura para aprender e conseqüente incremento na produtividade, no sucesso escolar e na criatividade.
Felder (2002), chama de estilos de aprendizagem uma preferência característica e dominante na forma como as pessoas recebem e processam informações, considerando os estilos como habilidades passíveis de serem desenvolvidas. Afirma que alguns aprendizes tendem a focalizar mais fatos, dados e algoritmos enquanto outros se sentem mais confortáveis com teorias e modelos matemáticos. Alguns também podem responder preferencialmente a informações visuais, como figuras, diagramas e esquemas, enquanto outros podem responder a partir de informações verbais – explanações orais ou escritas. Uns preferem aprender ativa e interativamente, outros já tem uma abordagem mais introspectiva e individual. Já as informações nos chegam de diversas formas, e, portanto, podemos nos tornar mais eficientes se desenvolvermos diferentes habilidades de lidar com tais informações.
O casal Dunn afirma:
Todo ser humano tem um estilo de aprendizagem e todo ser humano tem potencialidades. É tão individual quanto uma assinatura. . .Nenhum estilo de aprendizagem é melhor -ou pior — do que qualquer outro. . .Todos os grupos — culturais, acadêmicos, masculinos, femininos — incluem todos os tipos de estilos de aprendizagem. . .Dentro de cada cultura, camada socioeconômica ou sala de aula, há tantas diferenças quanto há entre grupos. . .”
Dos conceitos acima é fácil reconhecer a ênfase nas diferenças individuais. E é isto que trabalhamos tanto no ensino como na aplicação pelo aluno das estratégias de aprendizagem escolhidas. Por um lado nossas incluem desde recursos didáticos mais tradicionais como preleções até dinâmicas de grupo, trabalhos corporais e intervenções psicoterápicas (a depender do caso e das circunstâncias). Por outro enfatisamos a necessária personalização das técnicas aprendidas, seja na escolha da estratégia em si, seja na sua aplicação em um contexto específico. E isto tudo nos leva novamente aos princípios fundamentais expostos no início deste texto. Na Officina da Mente autonomia, método, demanda individual e importância do conhecimento não são abstrações mas determinismos concretas de ação.
Metacognição
Metacognição é um termo amplo, usado para descrever diferentes aspectos do conhecimento que construímos sobre como nós percebemos, recordamos, pensamos e agimos. Uma capacidade de saber sobre o que sabemos. Um pensamento sobre o pensamento, uma cognição sobre a cognição ou um atributo cognitivo ou conhecimento sobre o fenômeno cognitivo (Metcalfe et al, 1994 e Hacker, 1998). Sendo, portanto, um discurso de segundo nível sobre o conhecimento, caracteriza-se como um sistema de pensamento focado sobre a atividade cognitiva humana.
As estratégias de aprendizagem são processos mentais que como vimos, têm um papel importante na aprendizagem, porque ao utilizá-las o aprendiz torna-se capaz de controlar o uso das suas competências e o uso das estratégias mais específicas, ou seja, de estratégias que o permitam realizar uma tarefa com o maior êxito possível.
Sempre que realizamos atividades, mesmo as mais simples e rotineiras, que executamos continuamente sem reparar nelas, ou as mais elaboradas que exigem de nós habilidades e conhecimentos mais complexos, é exigido de nós o controle sobre alguns elementos dessa atividade, ou a realização de analogias com conhecimentos já adquiridos para que obtenhamos êxito.
Assim sendo, o uso das estratégias solicita do indivíduo uma capacidade de refletir sobre seus próprios processos mentais. A metacognição é um pensar sobre seus próprios pensamentos, um conhecer o seu próprio conhecimento. Por isto é uma ferramenta importante no aprendizado ao permitir que o aprendiz gerencie a própria atividade.
E é também por isto que a metacognição, surgindo agora como nova área de investigação psicológica traz renovado interesse no estudo e atualização das estratégias de aprendizagem. Nesta mesma linha, a Officina da Mente promove em suas atividades o desenvolvimento de competências metacognitivas de modo a favorecer que o aprendiz possa gerencias as estratégias de aprendizagem que ensinamos.
Na Officina da Mente o uso dos conceitos metacognitivos subordina-se também aos princípios já apresentados. Pensar por si é ser autônomo buscando os próprios objetivos. Gerenciar o conhecimento próprio é beneficiar-se do método, e isto tudo é em si valorizar a atividade intelectual.
Crenças epistemológicas
No dizer de Graykling (1996)
A epistemologia, também chamada teoria do conhecimento, é o ramo da filosofia interessado na investigação da natureza, fontes e validade do conhecimento. Entre as questões principais que ela tenta responder estão as seguintes. O que é o conhecimento? Como nós o alcançamos? Podemos conseguir meios para defendê-lo contra o desafio cético? (escola que defende a impossibilidade de conhecer-parênteses meu)
Sendo filosófica é predominantemente racional e especulativa buscando o absoluto. Mais recentemente, as crenças epistemológicas vem se firmando como uma interface entre a epistemologia e a psicologia, ao debruçar-se sobre aspectos pessoais de natureza epistemológica.
Segundo Hofer e Pintrich (1997), o estudo das crenças epistemológicas vem abrindo possibilidades para a compreensão dos processos cognitivos. Esses autores afirmam que as crenças epistemológicas indicam a maneira como os indivíduos acreditam chegar ao saber e às teorias e crenças sobre esse saber, tanto quanto o modo como tais premissas epistemológicas compõem e influenciam o processo cognitivo de pensamento e raciocínio. As teorias pessoais epistemológicas apresentam dimensões múltiplas, a saber, crenças sobre a natureza do conhecimento e do processo do saber.
As crenças podem funcionar como importantes mediadores cognitivos. Elas são o motor interno, determinam a motivação intrínseca, que depende dos desejos, percepções e motivações do indivíduo (Peixoto, 1997), interferindo pela sua transferência no objeto em estudo e influenciando a interpretação e a aquisição do novo conhecimento.
Segundo Ausubel (apud Moreno 1988), aprender é incorporar algo novo à trama cognitiva pré-existente. Essa trama cognitiva forma-se graças a estudos, experiências e vivências, tanto cognitivas como afetivas (Peixoto, 1997).
Consequentemente o significado que duas pessoas atribuem a um mesmo conceito será diferente, porque orientado pelo caráter individual das crenças.
Isto significa que as crenças epistemológicvos podem influenciar, e de maneira bastante profunda e sutil, a maneira pela qual um dado aluno aprende um conteúdo específico. Por exemplo, por mais que o professor enfatize a autonomia, isto de nada adiantará se o aluno acredita que o saber é algo estático e exclusivamente transferido do que sabe mais para aquele que asabe menos. Este aluno em particular poderá até mesmo memorizar mecânicamente os conceitos e importância da autonomia, mas esta jamais fara parte dele como conceito integrado aos seus pensamentos e ações.
Significa dizer que as crenças epsemológicas atuam como intérpretes do conhecimento a ser aprendido. A depender delas os conteúdos tomam para o aprendiz diferentes significados, podendo mesmo a se configurarem como algo oposto ao que o professor originalmente desejara.
É por isto que, nos momentos adequados trabalhamos com nossos alunos os aspectos epistemológicos pertinentes. É importante que o aluno fundamente sua autonomia em uma noção de conhecimento como algo positivo e mutável, passivel de ser construido pelo aprendiz. Importa que ele perceba sua capacidade e desenvolva sua competência em planejar e estudar. Para ele então, o conhecimento precisa se entendido como resultado de um processo interno do aluno. Importa ainda perceber a utilidade do saber, de modo que possa fazer as transferências de conteúdo, indispensáveis a integração do novo conhecimento à sua vida diária. Importa finalmente que possa entender o aprender como um processo de ampliação da sua visão de mundo, para que ele possa de forma soberana e crítica integrar-se à sociedade onde vive.
Conclusão
Se você leu os três posts que procuram responder à perguntar “O que é aprender a aprender?” pode agora entender que a resposta é mais complexa e ampla do que o mero domínio de algumas técnicas de aprendizagem. Implica em uma postura de vida específica. Implica em uma consciência de si mesmo como agente de si e responsável pelo mundo em que vive. Neste sentido então é que na Officina da Mentes entedemos que apresender a aprender é uma forma de viver.
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