O CONHECIMENTO segundo PAULO FREIRE
Nas últimas semanas trouxemos os conceitos de conhecimento segundo Whitehead e Dewey. Hoje apresentamos este conceito na visão de Paulo Freire.
Ao contrário dos pensadores já citados, que exprimem o pensamento da tradição anglo-americana, Freire fala à partir de um contexto latino-americano de privação educacional e opressão política, devotando sua vida a educação de camponeses analfabetos e desassistidos no Brasil, Chile e do 3o. Mundo. Seu maior trabalho foi a Pedagogia do Oprimido, onde descreve tanto os métodos que desenvolveu e aplicou, como uma reflexão filosófica sobre seus fundamentos e ramificações. Partilha com Whitehead e Dewey a crítica à educação tradicional, que denomina de “conceito ‘bancário’ de educação, no sentido que aos estudantes só é permitido o receber, arquivar e armazenar os depósitos”.
O Dialogismo da Cognição
Em sua crítica à este conceito, entende o processo cognitivo como “dialógico”. Aqui não só as relações professor – aluno se tornam mais equânimes, como também a concepção do processo educacional altera-se radicalmente. Para ele a educação não é um fenômeno politicamente neutro, mas um meio de opressão ou liberação dependendo não apenas de como é usada, mas ainda da forma que é compreendida.
De acordo com Freire o “conhecimento emerge apenas através da invenção e reinvenção, através de um questionamento inquieto, impaciente, continuado e esperançoso de homens no mundo, com o mundo e entre si”. O conhecimento é um processo que transforma tanto aquilo que se conhece como também o conhecedor. Isto é, o conhecimento surge apenas da relação dialógica e recíproca entre um trinômio formado pelo conhecimento ele mesmo, o professor e o aluno.
A proposição de problemas
Central na compreensão dialógica do processo de conhecer é a noção de “proposição de problemas”. Como Dewey ele acredita que o verdadeiro aprendizado só acontece quando o aprendiz é colocado de frente a um problema, que o impede temporariamente de implementar suas decisões ou satisfazer seus desejos. Esta noção engloba dois aspectos interrelacionados;o papel do professor e a “elevação do nível de consciência”.
O primeiro aspecto refere-se ao papel do professor em que este é visto como aquele que cria situações nas quais o aprendiz encontra obstáculos a vencer. Sua filosofia afirma o homem como um ser no processo de tornar-se. Seres inacabados em uma realidade também por terminar. É nesta consciência de incompletude que se fundamenta a educação como uma atividade exclusivamente humana. Neste sentido. conhecedor e conhecimento, tal qual o problema e sua solução, são relatadas simbióticamente e dinâmicamente, não estaticamente e passivamente.
O segundo refere-se a aspectos envolvendo a idéia de “elevação do nível de consciência”. Em oposição a Dewey, que coloca o aprendiz engajado ativamente na solução de problemas, Freire afirma que muitos de nós nem mesmo percebemos sua existência. Isto é particularmente verdadeiro em situações de opressão política. Assim implícita na “proposição de problemas”, está a necessidade de conscientizar-se dos problemas que existem a nossa volta. Neste sentido, preocupação de relevo para Freire é a “política da educação”, algo que Dewey e Whitehead nem mesmo se deram conta.
Linguagem: Pragmatismo e Reflexão
O eixo da compreensão dialógica da cognição é o caráter duplo da linguagem; pragmatismo e reflexão. Em suas palavras “No mundo encontramos duas dimensões, reflexão e ação, em uma interação tão radical que se uma é sacrificada, mesmo parcialmente, a outra imediatamente sofre. Não há palavra verdadeira que não seja simultaneamente uma praxis. Assim, falar uma palavra verdadeira é transformar o mundo”. A dimensão pragmática da linguagem refere-se à sua ação sobre o mundo. Quando falamos, o fazemos com o objetivo de atingir determinados fins, descrever, comunicar-se, desculpar-se, entreter, etc. Isto é o que Freire denomina de “praxis”.
Já a reflexão associa-se à qualidades usualmente relacionadas à cognição, tais como definição, análise e inferência. Através da linguagem identificamos, criamos e construímos um mundo multifacetado, no qual vivemos. Isto é o que Freire denomina de “nomear”: “Existir, humanamente é nomear o mundo, é modificá-lo.Uma vez nomeado, o mundo reaparece para aquele que o nomeia como um problema, requerendo do nomeador nova nomeação.Homens não se constróem em silêncio, mas na palavra, no trabalho, na ação-reflexão”.
Concluindo
Em Freire fica perfeitamente claro que nossa compreensão do processo de conhecer é crucial para determinar como construímos e experimentamos o mundo, para nós e para os outros. Ao mesmo tempo, deve se reconhecer que a filosofia educacional de Freire é um pouco limitada pela mesma característica que a torna tão poderosa, isto é, seu formato quase que exclusivamente político. Sua extrapolação a contextos outros que não os onde originalmente se desenvolveu, implica em alguns ajustes
Referência:
Gill, Jerry H.: Learning to Learn:Toward a Plilosophy of Education (cap 1), – Ed.:Humanities Press International, Inc., Atlantic Highlands, New jersey, pp 25-31, 1993..
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Olá, gostaria de saber de qual livro do Paulo Freire vc retirou a frase,:
“conhecimento emerge apenas através da invenção e reinvenção, através de um questionamento inquieto, impaciente, continuado e esperançoso de homens no mundo, com o mundo e entre si”.
nao encontrei esse livro.
desde ja agradeço
Att,
Joyce
Não citei Paulo Freire do original, e sim por referência ao livro do Gill, este apresentado ao final deste post.
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