Ao mestre, SEM carinho.
Zuenir Ventura
O Globo, 16/9/2009
Entre as fotos publicadas na semana passada na primeira página do jornal, há duas, de Marcelo Piu, que eu elegeria como das mais emblemáticas e cujo título poderia ser “O passado bate à porta”. Elas relembram uma cena comum nos anos de chumbo, quando reivindicações e manifestações de protesto, principalmente vindas de setores da inteligência, eram sempre reprimidas com violência. Numa, um PM apontando a pistola e pronto a disparar contra o inimigo parecia ter à sua frente um bando de baderneiros ou perigosos bandidos, e não profissionais com a missão, árdua e mal remunerada, de educar crianças em geral, inclusive os filhos dos que estavam atrás daquelas armas. Eram professores, onze dos quais saíram feridos, como aquele da outra imagem, que é carregado com um furo sangrando na coxa. Sei que a polícia alega que revidou a provocações, mas será que não teria sido possível dialogar com eles, antes do emprego de uma truculência mais adequada a um campo de batalha? Acho que sim, tanto que, no auge da confusão, alguns deputados conseguiram acalmar os ânimos, usando a conversa em vez do revólver, do cassetete e das bombas de efeito moral.
Não quero entrar no mérito da questão, já que os dois lados pretendiam ter razão – os professores com seu pleito de acrescentar mais uma merrequinha a um salário aviltante, e o governo alegando o impacto negativo que a medida causaria nas suas contas. Uma coisa, porém, ficou mais uma vez demonstrada: a manutenção da ordem urbana está entregue ao despreparo e ao desequilíbrio emocional da nossa polícia, que não sabe que essa não é a maneira de tratar qualquer classe, muito menos a dos professores. O governo estadual deveria dedicar um pouco mais de carinho aos nossos mestres. Sou do tempo em que as moças queriam ser “normalistas”, isto é, fazer o curso de preparação para serem professoras. A carreira era muito disputada e exaltada em prosa e verso: “Vestida de azul e branco,/trazendo um sorriso franco/num rostinho encantador,/minha linda normalista/rapidamente conquista/meu coração sem amor” (Benedito Lacerda e David Nasser). Hoje, o magistério deixou de ser uma profissão convidativa. Calcula-se que só na capital há 16.800 tempos de aula vagos, o que significaria um déficit de 1.400 profissionais. Também!, além de ganhar pouco, professor no Rio, se for para a rua reclamar, corre o risco de apanhar.
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Nota:
Quem acompanha o meu blog sabe que não costumo tratar de temas mais diretamente sociais ou políticos. Há pessoas mais competentes que eu para tal. Prefiro tratrar de assuntos mais ligados à minha especialidade, e com isto tentar preencher uma lacuna que identifico. No entanto, vez por outra, acho importante manifestar-me. Este é o caso deste post, onde repercuto as palavras do Zuenir. Faço minhas as dele.
O futuro somos nós que escolhemos, e tratando nossos professores desta forma fica muito claro qual estamos escolhendo…
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